O levantador Ricardinho, que protagonizou um dos episódios mais polêmicos dos Jogos Pan-Americanos do Rio – foi cortado da seleção brasileira de vôlei pouco antes do início da competição – lança nesta terça-feira, em Maringá (PR), onde vive, o livro “Levantando a Vida”. O último capítulo deve ser o mais saboroso: é nele que o jogador conta sua versão da confusão que resultou no seu corte.
Com o exemplar número 17 (número também da camisa que usa na seleção) do livro nas mãos, Ricardinho diz que, por contrato com a editora Dental Press, não pode divulgar o texto do capítulo que ele mesmo escreveu. Campeão olímpico e mundial, ele garante que há uma “ferida aberta” e não imagina como poderá se reintegrar à seleção nesta temporada.
“Fui humilhado. O que me decepciona é o ponto a que [o técnico Bernardinho] chegou, de dizer que não me suportava, me cortou em dez minutos, me humilhou, disse que eu estava passando dos limites, que eu só reclamava”, conta Ricardinho, sobre o corte, feito no Rio, na frente de todos os jogadores da seleção, dias antes da estréia brasileira no Pan.
Ricardinho, de 31 anos, revela que ouviu tudo calado e saiu da reunião sem dizer nada. Assegura que seu corte não está relacionado a reclamações sobre a premiação do título da Liga Mundial ou à apresentação no Rio com atraso, como chegou a ser divulgado. “Pus no livro tudo o que aconteceu na última viagem da Liga Mundial”, explica.
Segundo Ricardinho, o prêmio pelo título da Liga Mundial, de US$ 1 milhão (pouco menos de 2 milhões de reais), dado pela Federação Internacional de Vôlei, foi dividido em 19 cotas, entre jogadores e comissão técnica da seleção, como havia sido acertado. Dos prêmios individuais – US$ 14,7 mil (cerca de 29 mil reais) de Gustavo, eleito melhor bloqueador, e US$ 35 mil (aproximadamente 68 mil reais) do próprio Ricardinho, o melhor jogador -, 50% do valor foi para os demais atletas. “Ninguém questionou essa premiação, não havia nada a discutir.”
Mas ele acha que a discussão entre os jogadores referente à divisão de um eventual prêmio pela medalha de ouro no Pan – R$ 1,2 milhão, que ainda não foi pago pela Confederação Brasileira de Vôlei -, durante a fase da Liga Mundial na Finlândia, pode ter sido um dos motivos do seu corte.
Os jogadores decidiram não dividir a premiação do Pan com a comissão técnica. “Votando, cada um levantando o dedo. A maioria venceu”, conta Ricardinho. Coube a Giba levar a decisão à comissão técnica, mas Ricardinho acha que, por ser capitão da equipe, Bernardinho, que sempre defendeu a divisão do prêmio entre todos do grupo, entendeu que ele era o mentor da articulação.
As reclamações de Ricardinho quanto ao hotel em que a seleção se hospedou na Finlândia – “De aeroporto, para curtas estadias”, conta ele -, devem ter entrado na lista dos fatores que Bernardinho descreveu como “desgaste” da relação. E também o fato de ter defendido a volta ao Brasil dos atletas mais cansados depois da classificação do time para a final da Liga Mundial, quando a seleção ainda estava em Toronto, no Canadá. Assim, os jogos na Finlândia não seriam disputados por todos os titulares, que voltariam somente para as finais, em Katowice, na Polônia.
Livro
“Levantando a Vida” foi escrito pelo jornalista Luiz Carlos Ramos – tem 256 páginas, 42 capítulos e mais de 130 fotos. Narra como Ricardinho construiu carreira no vôlei desde menino.
“Estou revivendo tudo. Gosto do livro todo, é minha história”, conta Ricardinho, que diz ter refeito mais de seis vezes o último capítulo, o do seu corte do Pan. Fazia, mandava para o escritor, que corrigia e devolvia. “Estava preocupado com o livro terminar com uma coisa feia, mas não queria dissociar algo alegre de uma das maiores decepções da carreira. Tinha de contar a versão verdadeira, sem ser negativo”, explica o jogador.
Outro lado
O técnico Bernardinho garantiu nesta segunda que não humilhou Ricardinho quando o cortou da equipe e se disse surpreso com essa “nova versão” dos fatos. “Apenas conversamos, expus meus pontos de vista, não tive a intenção de humilhá-lo”, diz o treinador.
Bernardinho afirma que o grupo não aceitaria atitude prepotente com um membro da “família”. “Acha que se eu tivesse humilhado alguém tão importante os jogadores teriam aceitado?”, questionou o técnico.
O comandante da seleção também confirma que não chamará Ricardinho antes de uma conversa. “Espero que a gente possa conversar e voltar a trabalhar juntos. Aguardo um passo em relação ao entendimento, mas ele tem de mostrar vontade”, avisa o treinador.