A empresa Sul América Capitalização S/A foi condenada a restituir o valor integral (R$ 6.148,02) das parcelas pagas pelo proprietário de um título de capitalização que desistiu de manter o contrato. Esse valor terá que ser corrigido em 1% ao mês. O cliente ajuizou ação de reclamação cível junto ao Juizado Especial do Planalto, em Cuiabá, porque a Sul América se recusava a devolver na íntegra os valores já pagos. A sentença foi proferida nesta segunda-feira (13 de agosto) pelo juiz Yale Sabo Mendes, que também declarou nulas as cláusulas contratuais que prevêem a restituição da quantia paga apenas no encerramento do plano de capitalização (processo nº. 1392/2006). Cabe recurso.
Na ação, o autor alegou ter tentado rescindir o contrato administrativamente, mas a empresa teria dificultado a rescisão, pois não lhe enviou resposta. Disse ainda que quando aderiu ao plano de capitalização foi obrigado a adquirir um seguro de R$ 100, o que configura ‘venda casada’, atitude vedada pelo Código de Defesa do Consumidor.
Na contestação, a Sul América explicou que o autor tinha conhecimento do contrato firmado e, portanto, não poderia imputar-lhe qualquer responsabilidade por informações alheias às estipuladas no contrato. Alegou ainda que o título de capitalização não é caderneta de poupança, na qual se recebe integralmente e a qualquer tempo o valor depositado. A empresa só havia disponibilizado para o cliente o valor de R$ 4.804,51.
Contudo, de acordo com o juiz, o tipo de contrato firmado entre as partes – contrato de adesão – contém condições abusivas excessivamente onerosas para a parte aderente, desequilibrando o negócio jurídico efetivado entre o autor da ação e a Sul América Capitalização. “Da análise dos autos, constata-se que o contrato firmado entre as partes é do tipo ‘contrato de adesão’. Não houve, como de regra não há neste tipo de negócio jurídico, qualquer relação que permitisse a manifestação da vontade da parte consumidora, posto que suas cláusulas já se encontram previamente fixadas”.
O juiz Yale Sabo Mendes explica que o contrato de adesão possibilita a intervenção judicial para a correção de cláusulas excessivamente onerosas para a parte aderente. “O CDC, cujas normas que visam àquela proteção e defesa são de ordem pública e de interesse social (art. 1º), considera nulas de pleno direito cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas, no caso de resolução do contrato de compra e venda de coisa móvel ou imóvel, por inadimplemento do comprador (art. 53). Esta disposição, por ser de ordem pública, aplica-se aos contratos anteriores ao referido estatuto legal, de forma a nulificar a cláusula do contrato que estabelece aquela perda”, observa.
Ele ressalta ainda que as atividades bancárias, financeiras e consorciais estão sujeitas às regras da legislação consumerista. “Sendo as normas de proteção e defesa do consumidor de ordem pública e interesse social, há de ser declarada, até mesmo de ofício, a nulidade de pleno direito de disposições contratuais que imponham ao consumidor onerosidade excessiva, importando em vantagem exagerada ao credor. (…) Neste caso entendo ser injustificável a espera do encerramento do plano, porque a administradora não pode reter o dinheiro para aplicação e tirar proveito de algo que de fato e de direito não lhe pertence, devendo ser reconhecida a nulidade das cláusulas contratuais”.
O magistrado explica que a multa contratual em razão da desistência do plano não tem aplicabilidade, uma vez que é abusiva. Ele diz que o proprietário de um título de capitalização pode desistir antes do encerramento do plano e inclusive receber imediatamente a importância já paga.
Em relação ao pedido de indenização por danos morais, o juiz Yale Mendes explica que a jurisprudência é pacífica que só a dor real e profunda enseja danos morais, não meros aborrecimentos ou desgastes emocionais. “O incômodo, preocupação e perda da tranqüilidade que passou o reclamante pela não devolução imediata dos valores pagos, em meu entender, constitui mero aborrecimento e desgaste emocional, e estes não são suficientes para gerarem danos morais. Assim, o mero incômodo, o desconforto, o enfado decorrentes de alguma circunstância e que o homem médio tem de suportar em razão de viver em sociedade não servem para que sejam concedidas indenizações”, assinala.
Transitado em julgado, caso a empresa não efetue o pagamento no prazo de 15 dias, ao montante da condenação será acrescido multa de 10%.
Lígia Tiemi Saito