Aos 57 anos, o carioca Luiz Fux toma posse nesta quinta-feira (10) como o novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), para um mandato de dois anos. A nova vice-presidente da Corte, pelo mesmo período, será a ministra Rosa Weber.
Fux foi escolhido em uma votação secreta, que, assim como tradicionalmente ocorre tem caráter apenas simbólico, com os ministros escolhendo aquele que esteja há mais tempo no Tribunal e que ainda não tenha sido presidente.
Indicado pela então presidente Dilma Rousseff (PT) após a aposentadoria de Eros Grau em 2011, Fux era o vice-presidente na gestão de Dias Toffoli e chegou a assumir temporariamente quando o agora ex-presidente se licenciou por questões médicas.
Com Luiz Fux, o STF volta a ser presidido por um ministro oriundo da carreira de juiz. O novo presidente do Supremo também é o primeiro judeu a assumir o cargo. A sua posse foi comemorada, em nota, pela Confederação Israelita Brasileira (Conib).
Diferentemente de Toffoli, Fux tem um histórico mais distante do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e já entrou em atrito com o presidente e os ministros militares.
A principal celeuma aconteceu apenas três meses atrás, quando o ministro lavrou uma decisão em que afirmava que as Forças Armadas não têm legitimidade para atuar como “poder moderador”em conflitos entre o Executivo e o Judiciário. Naquele momento, STF e o Palácio do Planalto vinham em rota de colisão com o descontentamento de Bolsonaro por decisões recentes.
Luiz Fux é frequentemente listado como um dos ministros da ala classificada como “legalista” ou “punitivista”.
Essas “alas” são informais e geralmente ficam marcadas nas decisões que tratam de aparentes dicotomias entre priorizar a punição aos réus ou a forma processual.
Os ministros “punitivistas” têm histórico mais alinhado às posições da Operação Lava Jato nas principais ações que tratam do modo de fazer justiça.
O novo presidente do STF foi um dos cinco magistrados que votou em 2019 para manter a prisão após condenação em segunda instância. Outros seis ministros, entre os quais se inclui Toffoli, foram maioria e derrubaram o cumprimento antecipado da pena — esses, geralmente, são chamados de “garantistas”.
A posse na Presidência do Supremo não vai alterar o salário de Fux. O ministro seguirá recebendo seu salário bruto, de R$ 45.856,13, composto de uma remuneração de R$ 39.293,32 mais um abono de permanência de R$ 6.562,81.
Currículo de Fux
Luiz Fux é doutor em Direito Processual Civil pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), título obtido em 2009. Foi também na UERJ que ele se formou em Direito, em 1976, e onde lecionou a partir de 1995, quando foi aprovado em concurso público.
Com Fux, o STF volta a ter na cadeira de presidente um ministro oriundo da magistratura. Dias Toffoli não havia sido juiz antes de ser escolhido para o Supremo, tendo sido advogado-geral da União no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O novo presidente da Corte está na magistratura desde 1982, depois de um curto período como promotor. Foi juiz de primeiro grau até 1997, quando se tornou desembargador.
Em 2001, foi indicado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Após dez anos no STJ, foi escolhido para o STF por Dilma e aprovado no Senado com 68 votos dos 70 presentes.
Quando seu nome foi aprovado, em 2011, deu entrevista à Agência Senado atribuindo a sua escolha a uma valorização da magistratura. “Achei que houve certa generosidade do Senado Federal, em razão de eu ter sido juiz de carreira, em valorizar aquele que se dedicou à nação e à causa pública durante tantos anos”, afirmou.
Fux e o PT
Indicado ao STF por um governo do PT, Luiz Fux teria dito a interlocutores da presidente Dilma Rousseff que “mataria no peito” durante o julgamento da Ação Penal 470, o Mensalão, caso fosse escolhido para compor a Corte.
Em 2012, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, ele confirmou ter dito a frase, mas afirmou que era uma referência de que como juiz de carreira ele teria experiência para julgar os casos difíceis que tramitavam no Tribunal naquele momento.
Fato é que durante o julgamento, Luiz Fux foi um dos ministros mais duros, votando para condenar a maior parte dos réus, incluindo os petistas acusados de liderar o esquema, como o ex-ministro José Dirceu, o ex-deputado José Genoíno e o ex-tesoureiro Delúbio Soares.
Em abril de 2018, Fux foi um dos seis ministros que votaram contra o habeas corpus que teria evitado a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O ministro é a favor da prisão após a condenação em segunda instância.
Fux e a Lava Jato
Mensagens atribuídas aos procuradores da Operação Lava Jato, divulgadas pelo site The Intercept Brasil, mostram que os integrantes da força-tarefa tinham no ministro Luiz Fux um aliado no Supremo Tribunal Federal.
Em mensagens aos colegas, o procurador Deltan Dallagnol, então coordenador da Lava Jato, afirmou que Fux tinha dito que a operação poderia “contar com ele”. Deltan também teria feito o mesmo relato em mensagem ao juiz Sergio Moro, que teria respondido “In Fux We Trust“, frase em inglês que significa “em Fux nós confiamos”.
A posse do novo presidente do STF acontece em um momento sensível para a Lava Jato. Enfrentando representações no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e diante da doença de sua filha pequena, Deltan pediu para deixar o comando da Lava Jato na semana passada.
Antes disso, o procurador tinha obtido no Supremo uma decisão favorável a ele dada por… Fux. O ministro concedeu uma liminar impedindo o CNMP de considerar uma advertência anterior ao julgar Deltan, abrandando a situação do procurador diante do conselho.
O ministro Luiz Fux também votou a favor de outras teses jurídicas partilhadas pela Operação Lava Jato ao longo dos últimos anos. O novo presidente do STF foi voto vencido em duas derrotas que as teses da Lava Jato sofreram no ano passado.
Ele foi contra o envio para a Justiça Eleitoral de crimes comuns conexos a investigações eleitorais e também foi contra a tese que deu aos réus delatados o direito de se manifestar após os delatores. Fux, assim como a Lava Jato, considera que delatores e delatados são ambos réus e devem se posicionar ao mesmo tempo no processo.
Fux e Bolsonaro
Em uma das poucas declarações públicas sobre a chegada do ministro Luiz Fux ao comando do STF, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou esperar que a Corte rediscuta a decisão que deu autonomia aos estados e municípios para definir medidas de distanciamento social durante a pandemia.
“Talvez com o novo ministro [na presidência da Corte], possamos rediscutir esse assunto. E espero que o Supremo seja sensível à discussão”, disse. “E eu, particularmente, achei que foi um exagero nos alijar completamente dessas questões de lockdown.”
A decisão, frequentemente criticada por Bolsonaro, foi aprovada por 9 votos a favor e nenhum contra durante sessão em abril.
Luiz Fux foi um dos ministros que votou a favor dos governadores e prefeitos, mas a principal rota de colisão com o Planalto foi mesmo diante da decisão sobre o papel das Forças Armadas, de junho.
A liminar de Fux provocou uma reação do Planalto, expressada em nota assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em conjunto com o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) e o ministro da Defesa, Fernando Azevedo.
O posicionamento diz que as Forças Armadas estão sob a autoridade do presidente e que estas não cumprem “ordens absurdas”, seja “a tomada de poder” ou decisões de “julgamentos políticos”. Tanto Mourão quanto Azevedo, generais da reserva, assinaram o posicionamento com o título militar ao lado dos nomes.
Apesar do atrito, ministros do governo iniciaram uma aproximação com Fux poucas semanas depois. Há a intenção de construir com o novo presidente uma boa relação semelhante a que foi estabelecia ao longo do mandato de Dias Toffoli.
No passado, Luiz Fux tomou uma decisão de peso a favor do hoje presidente Jair Bolsonaro. Em setembro de 2018, ele foi um dos três ministros que votaram para recusar uma denúncia contra o então deputado federal, que enfrentava uma acusação de racismo no STF por expressões usadas em uma palestra.
Votos
Pouco tempo depois de tomar posse, em 2011, o ministro afirmou ao site G1 que a população havia “votado errado” no plebiscito de 2005, que tratava do comércio de armas e munições no Brasil. A declaração foi dada para rejeitar a possibilidade, cogitada naquele momento, da realização de um novo plebiscito.
Trata-se de uma questão considerada importante pelo presidente Jair Bolsonaro.
Em 2019, caiu na mesa de Fux um pedido do PCdoB para suspender um decreto do presidente sobre posse de armas, mas o ministro negou a urgência, que estava para ser decidida durante seu plantão no STF.
Durante o seu período como ministro do Supremo, Luiz Fux votou a favor de pautas ligadas aos direitos humanos. Fux foi favorável à permissão do aborto de fetos anencéfalos, a união civil entre homossexuais, a equiparar a homofobia ao crime de racismo.
Guilherme Venaglia, da CNN, em São Paulo