Eduardo sabe que a sua situação é complicada. Aos 37 anos, ele vive sozinho, é saudável, trabalha, família… Tem uma vida normal. A complicação aparece, porém, em outro âmbito, na vida amorosa: ele tem um caso com um homem que é casado com uma mulher e acabou de ter um bebê.
Os dois se conheceram em uma reunião de condomínio, logo antes de Eduardo se mudar para o prédio. Até então, o papo entre eles era super amigável, com cara de conversa entre vizinhos. “Para mim, Paulo* era um cara hétero, casado, e eu nunca tive esse olhar com segundas intenções. Era um rapaz normal que estava fazendo amizade no condomínio, um cara sem preconceitos”, conta ao Yahoo Vida e Estilo.
A situação mudou no dia que Eduardo voltou ao prédio para medir a sala – a ideia era comprar um sofá novo -, e o vizinho pediu para acompanhá-lo. Papo vai, papo vem, Paulo começou a fazer perguntas sobre a vida pessoal do novo morador, que chegou a ficar um pouco constrangido com os questionamentos e comentários, incluindo algumas indiretas.
“Eu, ingênuo que sou, comecei a achar que ele estava arrependido de ter casado. É a primeira namoradinha dele, eles estão juntos há mais de dez anos e resolveram casar agora. Na minha concepção, ele tinha se arrependido ou estava procurando alguém para desabafar…”, explicou.
Mas não era bem isso que Paulo buscava. Depois, ficou claro que o que ele procurava era mais do que um amigo para conversar sobre os seus problemas conjugais. Os dois estão juntos há três anos.
“No começo, achei que ele era apenas um cara hétero curioso por uma relação diferente, e aquilo seria ‘fui, supri a minha curiosidade e acabou por aqui'”, continua Eduardo. Tanto que o casamento de Paulo nem era um assunto entre os dois.
Após um ano juntos, Eduardo percebeu o incômodo, porque a situação já não era mais algo pontual, mas, sim, recorrente e duradoura. “Resolvi conversar, porque não acho certo, não acho legal e tenho empatia pela outra pessoa. Vejo ele com um certo bloqueio quanto a esse assunto, por ele não se aceitar nem bissexual, nem homossexual. Ele não consegue classificar como um caso extraconjugal. Ele vê isso como dois amigos se satisfazendo e se curtindo”.
Depois do papo, os dois continuaram se encontrando, mas tanto o casamento quanto a relação deles não foi mais assunto. O sentimento também não evoluiu. Se antes Eduardo sentia o coração bater mais rápido, agora ele vê a relação com Paulo da mesma maneira: “Dois amigos que se ajudam”.
Aliás, Eduardo não vê a relação saindo disso. Para ele, mesmo que Paulo termine o casamento, ele não imagina o casal andando livremente na rua e assumindo o relacionamento abertamente. Isso porque a família dos dois lados se conhecem – Paulo conhece os pais de Eduardo e ele a esposa e a família – e há o medo dos julgamentos. “Seria uma guerra que eu não compraria”, diz.
História sem final feliz
Eduardo sabe que o relacionamento não é correto – e que existem muitas coisas em jogo – e assume que até mesmo para ele é tudo muito complexo. E a confusão aumentou quando Paulo disse que teria um bebê.
“Quando ele veio me dizer que ia ter uma filha, eu parabenizei, mas foi meio que um choque”, disse. “Parecia que ele estava dando a notícia de uma morte. Esperava que ele viesse com mais entusiasmo. Ele não parecia uma pessoa que estava dando uma notícia feliz. Para mim, já estava difícil quando ele era só casado, mas quando teve a história da criança fiquei querendo falar: ‘Para mim, já deu’. Porque agora é um pai de família. Só que isso sou falando. Para ele, continuou tudo normal.”
“Ele casou, teve filho, e, segundo ele, não mudou nada. Quando teve a história da criança, tentei terminar. Falo: ‘Chega’, mas eu sou um pouco sem-vergonha. Ponho um ponto final, mas ele fica insistindo, e na carência acabo cedendo e tudo volta ao que sempre foi”.
Para Eduardo, não parece também que Paulo quer parar tão cedo ou se preocupa com o que acontece fora da relação entre os dois. “Às vezes, tenho a sensação que ele quer ser descoberto”, diz. “Ele tem essa preocupação de que a esposa não pode descobrir, mas não vejo ele agindo com cautela. É uma prisão, ele tem esse conflito, mas se isso vier à tona, não vejo ele tão preocupado.”
Isso fica visível na forma como eles combinam de ver. A ideia inicial era usar um código pelo WhatsApp, indicando quando um quer ver o outro e se isso é possível naquela hora. Mas Paulo decide os próprios horários e não aceita “não” como resposta: ele liga repetidas vezes (já chegou a 15 vezes seguidas!), vigia o vizinho questionando porque ele não atende se a luz está do apartamento está acesa e bate na porta incessantemente até que ele atenda.
Entra aí, aliás, o comodismo. Paulo diz que, para ele, a situação está ótima: ele tem o casamento dos sonhos, não pensa em largar a esposa, tem uma filha e satisfaz os seus desejos com Eduardo quando lhe é conveniente. Para Eduardo, isso também funciona: uma relação sem as amarras de um namoro tradicional, e que lhe dá a liberdade que tanto busca agora. “Não vou dizer que quero que termine, porque aí eu teria que viver algo fixo. Talvez não queira que isso mude também. Para mim, tá bom também”.
Parece mesmo uma encruzilhada. O convívio familiar é o que complicou a situação ainda mais para Eduardo, que não vê essa como uma história com final feliz. “Só acabará de vez se a gente enjoar, ele procurar outras pessoas ou eu começar um namoro… Não vejo a relação mudando da forma que está. Vejo que essa relação pode se encerrar por coisas da vida. Para mim, chegou no ápice”.
*Nome fictício usado para apenas para facilitar a compreensão da história