Histórias de amor interrompidas por agressões verbais, físicas e que, em alguns casos, culminaram em feminicídios não param de acontecer pelo País. Só em 2017, foram mais de 117,2 mil casos registrados no Ligue 180. Protagonistas da violência familiar, Maria Odete Marques, de 46 anos, e Cleide Gomes* (nome fictício), 45 anos, hoje comemoram a própria vida e sabem a importância de terem dado um basta às suas relações abusivas, evitando fazer parte de uma triste estatística.
Antes de casar, Cleide recebia flores quase todos os dias e via o namorado como um “lorde inglês”. Porém, a verdadeira face dele começou a aparecer após o casamento. Grosserias e palavras tortas da parte dele se transformaram em violência física e sexual. O medo permeava a relação: o então marido tinha porte de arma e ameaçava a todos de morte. Durante quase três anos, ela viveu abusos diários.
Ciclo de violência
A presidente da Comissão Especial de Combate à Violência Familiar da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Lúcia Bessa, aponta a importância de procurar ajuda, lutar e romper o ciclo de violência. “Mesmo diante de uma situação complexa, não deve deixar de denunciar (…) Se ame, se respeite e denuncie, denunciar é o único ato de amor próprio e amor à família”, afirmou.
Com Maria Odete, as agressões começaram quando sua primeira filha completou dois anos. Na expectativa de que o comportamento mudasse, alongou a relação e teve mais duas filhas com seu agressor. Aterrorizada, ela acreditava que tinha provocado os abusos que sofreu por 13 anos. “A cena que não sai da minha cabeça foi quando ele tocou fogo na minha casa, comigo e minhas filhas dentro, e ainda encostou uma faca em mim. Na frente das minhas filhas, no meio do caos, eu tive que dizer que amava ele para ele parar”, afirmou.
Coragem e apoio
Em 1998, com apoio da família, Cleide tomou a atitude de encerrar o casamento e preservar sua vida. Na época, tinha consciência de que acabaria morta se continuasse casada. Dez anos depois, vive uma nova vida, sem nenhuma semelhança com a anterior. “Atualmente, tenho uma vida ótima, sou realizada profissionalmente, tenho um filho lindo”, afirmou.
Maria Odete ainda batalha para chegar no mesmo ponto que Cleide. Procurou a polícia, denunciou seu agressor, acionou a Justiça, conseguiu a guarda das filhas e a partilha de bens. Sofreu perseguições e começou a viver sob tensão. Quase 10 anos depois, o receio de que algo ainda possa acontecer continua. “Ainda tenho medo dele. Ele disse que só sossegaria quando me matasse.”
Atendimento
Delegada Titular da 1ª Delegacia de Defesa da Mulher de São Paulo, Giovanna Valenti Clemente conta que 70% dos casos que chegam à delegacia estão relacionados à violência doméstica. Para ela, além da Lei Maria da Penha, o fato de ter delegacias especializadas, com mulheres no comando, contribui para que as mulheres agredidas procurem ajuda.
“A pessoa tem uma liberdade maior para entrar em uma delegacia da mulher e expor um problema íntimo, familiar. A mulher hoje busca mais os seus direitos, ela sabe quais são e vai ao encontro deles”, disse a policial.
Fonte: Governo do Brasil