Uma data histórica ao longo de 8 anos, em que algumas mães, unidas pela saúde e sobrevivência dos seus filhos, passaram a compartilhar experiências, a criar materiais e unidades de apoio para os familiares de crianças cardiopatas.
A comemoração teve início hoje, às 19 horas, na sede em São Paulo-SP – Rua Raul Carmilo, 58, Bela Vista – e reuniu a diretoria da AACC Pequenos Corações, coordenadores dos núcleos voluntários de diferentes estados, as mães que se hospedam na sede e também os médicos que acompanham a instituição.
Em meio a dor, muito amor!
Foi em fevereiro de 2010 que Larissa Mendes, de Londrina-PR (e Itália), Márcia Adriana Rebordões, de Bauru-SP, Patrícia Drummond, de São Paulo-SP e Fabiola Bilro, de Recife-PE, davam corpo à associação, motivadas pelas descobertas nas trocas de mensagens via Orkut e e-mails, com o objetivo de aprender, oferecer esperança e tornar menos árdua a tarefa dos pais diante da difícil descoberta: de que seu filho – durante a gestação ou após o nascimento – fora diagnosticado como “tendo um coração especial”.
“Senti na pele a angústia de perder o chão, de sentir medo e solidão por desconhecer o assunto. Pude me reerguer e acreditar na sobrevivência do meu primeiro filho. Diante do que vivi, quando a informação era praticamente inexistente, me determinei a contribuir para que outras mães e pais recebessem esse cuidado que me fez enorme falta num momento tão frágil”, conta Larissa Mendes, uma das fundadoras.
A data (24 de fevereiro) foi escolhida propositalmente, para homenagear Tiago Saia Rebordões, filho da também fundadora e atual presidente, Marcia Adriana, sendo este o dia do seu aniversário.
Diagnosticado com a Síndrome de Hipoplasia do Coração Esquerdo (SHCE), considerada a cardiopatia mais grave existente, Tiago passou por três cirurgias, mas não resistiu. A homenagem foi um incentivo de que a batalha não tinha sido em vão. Estava apenas no começo, pois muitos outros pequenos corações viriam a conhecer a garra de uma mãe que perdera seu filho e, durante a batalha, aprendera o suficiente para alertar pais, médicos, imprensa e a comunidade, dando voz às famílias para que outros filhos pudessem sobreviver.
Cardiopatia Congênita
1 em cada 100 crianças nasce com um coração especial e os exames preventivos ainda estão longe de ser motivo de comemoração no sistema público ou particular.
Cardiopatia Congênita é qualquer anormalidade na estrutura ou função do coração que surge nas primeiras 8 semanas de gestação quando se forma o coração do bebê. Ocorre por uma alteração no desenvolvimento embrionário da estrutura cardíaca, mesmo que descoberto no nascimento ou anos mais tarde.
Os principais sintomas são:
Em bebês
· Pontas dos dedos ou os lábios roxos;
· Transpiração excessiva e cansaço durante as mamadas;
· Respiração acelerada enquanto descansa;
· Pouco apetite associado a baixo ganho de peso;
· Irritação frequente, sem consolo;
Em crianças
· Cansaço em atividades físicas e dificuldade em acompanhar o ritmo dos amigos;
· Não cresce e não ganha peso de forma adequada;
· Infecções respiratórias com frequência;
· Lábios roxos e a pele mais pálida quando brinca muito;
· Coração com ritmo acelerado (taquicardia).
Mesmo distante de ser a “realidade ideal”, após 5 anos, algumas significativas bandeiras foram levantadas pela AACC Pequenos Corações, com conquistas declaradas oficiais em território brasileiro:
· A inclusão do Teste do Coraçãozinho no Sistema Único de Saúde em 2014
· A instituição do “Dia de Conscientização da Cardiopatia Congênita” em 12 de junho, cuja data foi adotada por 39 cidades e 11 estados do país
· A distribuição do medicamento Palivizumabe, essencial para bebês cardiopatas, pelo Sistema Único de Saúde em Londrina
· A desmitificação das mais de 40 cardiopatias congênitas, com informativos sobre o diagnóstico, tratamentos e o engajamento de especialidades médicas para os exames preventivos desde a gestação
· O acolhimento de famílias em mais de 17 Estados brasileiros, com 53 núcleos voluntários da AACC Pequenos Corações no país
· A publicação de um Guia exclusivo sobre cardiopatia congênita (De: Mãe Para: Mãe), em 2014 – a realização de um sonho!
· A divulgação do exame ecocardiograma fetal durante a gestação (após a 26ª semana), em especial para os grupos de risco, para que os pais possam receber todo o amparo e infraestrutura necessária no nascimento do bebê
· O significativo apoio de diferentes especialidades, como os ultrassonografistas, com maior atenção ao feto durante os exames da ultrassom morfológica (no 2º trimestre da gestação), e dos pediatras, na ausculta cardíaca dos recém nascidos, sensíveis à causa e às campanhas da AACC
Cientes da relevância das campanhas informativas, a Pequenos Corações também comemora o sucesso dos inúmeros eventos de conscientização realizados em diferentes regiões do país, alcançando milhares de famílias e crianças.
Atualmente, os canais nas redes sociais somam mais de 12 mil curtidas, com mais de 5 mil amigos e mais de 5.200 seguidores nos perfis e grupos exclusivos de mães, sendo mais de 4.500 membros que recebem, diariamente, orientações, trocas de experiências, além da formação de uma rede solidária no acolhimento e suporte às famílias durante os tratamentos. Segundo Marcia Adriana Rebordões, presidente da AACC, o encorajamento aos pais e às crianças cardiopatas é um significativo avanço. “O trabalho da Pequenos Corações vai além de “dar esperança”. Hoje, é possível ter uma vida normal, plena e feliz, já que 90% dos cardiopatas que têm acesso ao tratamento adequado chegam à vida adulta”, comemora a presidente.
A jornada continua…
Ainda há muito a ser feito. Atualmente, o déficit de atendimentos aos cardiopatas é de 62%, aproximadamente. No Brasil, nascem 23 mil crianças com problemas cardíacos por ano e destes, pelo menos 80% necessitarão de uma cirurgia cardíaca. Porém, cerca de 13 mil delas não recebem o tratamento, principalmente por falta de diagnóstico ou vagas na rede pública.
De acordo com pesquisas americanas, o número de crianças que morrem por defeitos cardíacos congênitos é duas vezes maior que o número de mortes decorrentes de todos os tipos de câncer infantil. Acredita-se que no Brasil esse número seja ainda maior, devido às dificuldades de tratamento. “Muitas crianças ainda morrem sem diagnóstico. As que o recebem, não conseguem atendimento fácil, pois o número de vagas pelo SUS é insuficiente ou porque o sistema não consegue organizar a transferência em tempo hábil para que a cirurgia seja feita com sucesso. Prova disso são as constantes matérias que lemos na mídia, de crianças que aguardavam vaga para transferência em hospital especializado e que vão a óbito nessa espera”, lamenta Larissa.
Apesar da implantação do Teste do Coraçãozinho, a Pequenos Corações sabe que muitas famílias passarão por tempos difíceis até que todas as crianças diagnosticadas consigam ter o tratamento que necessitam. “Antes sabíamos apenas os números, a quantidade de crianças que morriam. Com os canais da Associação, agora vemos os nomes, os rostos e as famílias desconsoladas. É muito triste”, desabafa Larissa.
Nas ações para os próximos anos, a batalha será por políticas públicas que proporcionem o tratamento global dessas crianças, seja o cardiológico fundamental, que garanta a sobrevivência dos cardiopatas, ou as terapias conjuntas, que melhorem a qualidade de vida delas, como a psicológica, fisioterapia, nutrição, dentre outras.