Dentre os três maiores produtores de soja do mundo, o Brasil é o único que não possui um sistema normatizado de classificação de grãos e descontos de soja. Enquanto na Argentina e Estados Unidos há publicações anuais sobre os descontos praticados pelas empresas e uma clareza no procedimento padrão de classificaçãoadotado, os produtores brasileiros padecem com a falta de metodologia e transparência das receptoras.
No modelo americano, as porcentagens de descontos são referenciais ao destino da soja, variando, por exemplo, quando para exportação, alimentação imediata e rações. Apesar disso, há um mesmo procedimento padrão de classificação. Segundo a professora da Universidade de Oklahoma, Carol Jones, também há no país uma certificação que, apesar de não ser obrigatória, é pré-requisito para o acesso a crédito junto aos bancos. Já na Argentina, os produtores podem recorrer a CAC (Cámara Arbitral de Cereales) quando se sentirem lesados no procedimento de classificação.
No contexto brasileiro, a Lei 9972/2000 regulamenta a classificação de produtos vegetais destinados diretamente à alimentação humana, compra e venda do poder público e importação. Mas a grande maioria da comercialização de soja em Mato Grosso não corresponde a esses destinos, ficando sem nenhuma regulamentação. “É preciso que tenhamos um marco, um indicativo, uma regra de orientação para classificação do produto que sai da propriedade e vai para as empresas”, explica Sinibaldo Junior, da empresa O Classificador. Outro problema é que as tradings declaram não se encaixar nos itens da Instrução Normativa 29/2011, destinada àcertificação de unidades armazenadoras, por não se enquadrarem como serviço de armazenagem.
Análises comparativas em mais de mil amostras dão visibilidade a diferenças significativas entre as tradings e o trabalho de pesquisa da Aprosoja, encomendado à empresa O Classificador. No parâmetro de impurezas o índice médio apurado nas amostras foi de 1,52% nas receptoras e de 0,89% na pesquisa. Em esverdeados as diferenças são bem maiores, 0,75% nas receptoras frente a 0,04% na pesquisa.
Além disso, o presidente da Aprosoja, Carlos Fávaro, lembra que a mesma soja tem resultados variados em empresas diferentes e que existem compromissos a serem cumpridos pelos produtores dentro da porteira da fazenda e pelas empresas fora dela. “É preciso que as tradings desempenhem honestamente a classificação. Essa pauta é a mais antiga que temos. Já discutimos na Câmara Temática do MAPA, fizemos um grupo de trabalho que obteve alguns consensos, mas os pontos mais importantes foram ignorados. Estamos cansados de ceder e não ver isso do outro lado.”
Frente a esse contexto, o desejo da Aprosoja, segundo Marcelo Duarte, diretor executivo, é que haja uma metodologia única na classificação e nos descontos. “Por exemplo, se o desconto de umidade ocorrer antes do desconto de impurezas, o produtor vai perder, pois será considerada a umidade também das impurezas, comogalhos, insetos, mato e etc.” O diretor executivo também frisou que além da padronização na metodologia, é preciso a inserção da tabela de descontos nos contratos dos produtores, e que isso não fere o livre comércio. “Queremos ter clareza, a exemplo dos bancos que foram obrigados a divulgar suas taxas. Isso não interfere no direito da empresa de estipular valores, mas protege o produtor que saberá antecipadamente quanto cada uma das empresas cobra e poderá optar por uma delas.”