A decisão dos ministros da Zona do Euro de tributar o dinheiro depositado em contas bancárias no Chipre é considerada "inquietante" e "surpreendente" pelas principais associações de correntistas europeus, que temem uma grave crise de confiança entre investidores e denunciam a medida como ilegal.
"As consequências são muito negativas. O resultado é uma desconfiança geral que pode, inclusive, repercutir na economia. Imagine se as pessoas começarem a retirar o dinheiro dos bancos para investir em outros serviços, como ouro ou imóveis, por exemplo?", disse à BBC Brasil Juan Manuel Viver, representante da Eurofinuse, a Federação Europeia de Usuários de Serviços Financeiros, entidade que representa cerca de 50 associações na Europa.
Viver não acredita que haverá corrida em massa dos clientes aos bancos europeus para retirar dinheiro, mas considera que a decisão abre um precedente. "As pessoas vão ter medo, pois vão pensar que se fizeram uma vez, podem fazer de novo", acrescentou.
Segundo ele, a União Europeia violou um acordo implícito de que os correntistas devem ser protegidos em caso de falência do sistema. "Mais uma vez, é o cidadão comum que paga o resgate do sistema financeiro".
A decisão de tributar os depósitos no Chipre foi tomada na madrugada do último sábado, em Bruxelas, após negociações entre ministros da zona do euro e o Fundo Monetário Internacional (FMI), para salvar o país da bancarrota.
O acordo prevê a cobrança de uma taxa de 6,75% em contas de 20 mil a até 100 mil euros, e de 9,9% nas contas acima desse valor. Contas com menos de 20 mil euros não serão taxadas. O Parlamento do Chipre votará a medida nesta terça-feira.
Garantia 'relativa'
A Adicae, Associação dos Usuários de Bancos e Seguradoras, na Espanha, também se disse surpresa com a decisão. "Entendemos que tributar depósitos é contrário à normativa europeia que protege os correntistas em caso de falência do sistema bancário. O que até agora era uma garantia absoluta passa a ser uma garantia relativa", explica o diretor de comunicação da Adicae, Fernando Herrero.
Herrero considera difícil prever a reação dos cidadãos europeus, mas não descarta a fuga de depósitos em alguns países. "Já vimos uma situação semelhante na Espanha. Com certeza, haverá clientes retirando dinheiro dos bancos, mas é difícil dizer se isso pode se tornar um movimento generalizado", afirmou.
Já o secretário-geral da F2IC, Federação francesa dos Investidores Individuais e de Clubes de Investidores, Aldo Ficurani, não acredita em um efeito dominó.
Segundo ele, o Chipre tem uma situação particular, com um número elevado de contas em nome de estrangeiros, e a medida europeia teria como alvo principal as pessoas que usam os bancos do país para lavar dinheiro ou fugir do fisco. "É um paraíso fiscal e acredito que os europeus querem acabar com isso". Ele considera, entretanto, que a medida é "preocupante", uma vez que também atinge o pequeno investidor cipriota, além abalar a confiança nas instituições europeias.
UOL-Economia