sábado, 23/11/2024
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Sobre a dívida externa

O presidente Lula tem dito alto e bom som que zerou a dívida externa do Brasil. Não é verdade – para ser politicamente correto. A dívida externa continua do mesmo tamanho. O que ocorre é que o total das reservas internacionais supera, no momento, o total das dívidas. Mas daí a dizer que elas estão zeradas tem uma diferença muito grande.
A dívida externa brasileira monta hoje 208 bilhões de dólares e a posição das reservas internacionais, pelo conceito liquidez internacional, era, em 09.12.2009, de 239 bilhões de dólares. Pelo argumento falacioso do governo, se utilizadas as reservas, nós quitaríamos toda a dívida e ainda sobraria troco. Seria ótimo se isso pudesse ser feito, mas não pode, mesmo que o governo queira. Senão vejamos.
A maior parte de nossa dívida externa, ou 60,5% do total, pertence ao setor privado – empresas brasileiras e estrangeiras operando no Brasil – e não ao Governo. Além do mais, do total da dívida externa privada, cerca de 84% correspondem a dívidas de médio e longo prazos. Essas dívidas estão lastreadas em contrato e não podem – ou não há interesse – de o setor privado quitá-las, no curto prazo. A parte restante da dívida privada se constitui de dívidas de curto prazo e corresponde a linhas de crédito para o financiamento do comércio externo e são renovadas periodicamente. Quanto maior a participação do Brasil no comércio internacional, maior a necessidade de capital flutuante para viabilizar as operações.
Das dívidas do setor público, cerca de 96% são de longo prazo, com vencimento em até 40 anos, e com juros cada vez mais favoráveis devido aos juros internacionais estarem em queda, não havendo, portanto, interesse do governo em quitá-las. As dívidas de curto prazo (até um ano) correspondem a cerca de 4% do total e, quase na sua totalidade, referem-se a linhas de financiamento de importação da Petrobrás, renovadas periodicamente.
Por outro lado, as reservas internacionais de um país representam o estoque de moedas estrangeiras à sua disposição e têm origem nos superávits do balanço de pagamento, que é o registro das transações entre o país e o resto do mundo. Em outras palavras: é a diferença entre a quantidade de moeda estrangeira que entra no país menos a quantidade que sai. Sempre que a entrada de moedas é maior que as saídas, acumulam-se reservas. Como no país não circulam moedas estrangeiras, elas são mantidas pelo Banco Central e, na quase totalidade, aplicadas no exterior. Cerca de 140 bilhões de dólares das reservas brasileiras estão investidos em títulos do governo americano, com prazo definido em contrato e rendendo juros.
O problema é que do total de moedas estrangeiras que entram no país, uma boa parte é formada por capital especulativo, de curto prazo, e que se aportam por aqui para ganhar a diferença dos juros internos, que estão entre os mais altos do mundo e os juros internacionais, os quais estão em níveis muito baixos – por volta de 1% a.a. no mercado americano. Mas, por ser um capital volátil, ele pode sair do país a qualquer momento e ao primeiro sinal de crise debandam. A título de informação, somente em outubro de 2008, no auge da crise internacional, houve uma fuga de capitais do Brasil, da ordem de 6,05 bilhões de dólares.
Essa volatilidade dos capitais internacionais transmite insegurança aos países e podem ser o canal transmissor de crises de um país para outro. Em 1997/98, no auge de uma grande especulação internacional, houve uma superlativa fuga de capitais dos países asiáticos, o que gerou uma crise que afetou os países do mundo todo, principalmente países emergentes como o Brasil, os quais foram arrastados para o meio do furacão, sem nenhuma razão substantiva para isso.
A acumulação de reservas é importante para que o país tenha musculatura para enfrentar choques externos, como a recente crise econômica. Mas isto tem um custo: a diferença entre o retorno da aplicação das reservas em instituições internacionais e o valor pago aos detentores da sua dívida interna, gera um custo fiscal para o governo. Também, em excesso, levam a uma desvalorização das moedas estrangeiras, em relação ao real, favorecendo as importações e prejudicando as exportações.
Recentemente, para evitar uma super apreciação do real, o governo resolveu taxar a entrada de capital estrangeiro em 2% de IOF (Imposto de Operações Financeiras). A medida teria sido tomada após levantamentos do governo mostrarem crescimento acentuado na entrada de capital especulativo no país. Do início do ano até o momento, já entraram no país mais de 25 bilhões de dólares para aplicações de estrangeiros na Bolsa de Valores.
Com se vê, as reservas e as dívidas são partes uma mesma equação, mas com enfoque administrativo diferenciado. Segundo um princípio da lógica tradicional: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

(*) Waldir Serafim é economista e professor universitário.

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Parmenas Alt
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