O confronto entre o ministro Gilmar Mendes e o juiz federal Fausto Martin De Sanctis no caso Daniel Dantas pode evoluir para um conflito institucional e é certo que haverá iniciativas na esfera do Ministério Público Federal, prevendo-se representação criminal por suposto crime de responsabilidade de Mendes. Podem ser apenas sinais do calor da hora, mas dificilmente o episódio tenderá para uma acomodação, pelo fato de a queda de braço ter causado um mal-estar como há muito não se via.
O presidente da Academia Paulista de Direito Criminal, Romualdo Sanches Calvo Filho, afirma que o episódio deixou “a população e o mundo jurídico perplexos”.
São conhecidas as divergências entre Mendes, MPF, Polícia Federal e juízes de primeira instância. A capacidade de o presidente do STF decidir contra o clamor público e sem se preocupar com opositores é admirada por magistrados e criminalistas. Ao criticar, por exemplo, a pirotecnia da PF, Mendes também condena a atuação de juízes que determinam interceptações telefônicas prolongadas e prisões que considera desnecessárias.
Agravou nesse episódio o fato de o magistrado haver “atropelado” instâncias recursais, reforçando o sentimento de que medidas tomadas por juízes de primeira instância podem ser facilmente derrubadas nas Cortes Superiores.
Esse fato pode ter estimulado a adesão de juízes federais ao assinarem o manifesto da magistratura. A questão é polêmica, mas os que se opõem ao ministro concordam com a avaliação do advogado Walter Ceneviva, que, em artigo na Folha, considerou que “há bons motivos processuais para sustentar que ainda não havia chegado a hora de a mais alta corte do país se manifestar”.
O juiz aposentado Wálter Maierovitch chega a sugerir que não está descartada a idéia de pedido de “impeachment” do presidente do STF.
Os procuradores da República articularam-se em apoio a De Sanctis antes dos magistrados. A iniciativa dos juízes, por sua vez, antecedeu a solidariedade prestada pelas entidades da magistratura. Incomodou aos procuradores, por exemplo, o fato de Mendes afirmar que “não é a primeira vez que o juiz federal titular da 6ª Vara Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo, Fausto Martin De Sanctis, insurge-se contra decisão emanada desta Corte”.
O procurador da República Celso Três diz que não é a primeira vez que o presidente do STF decide pelo habeas corpus, atropelando outras instâncias.
O manifesto da magistratura federal da Terceira Região, formalizando “indignação” e “discordância” com a determinação de Mendes de encaminhar cópias de sua decisão no caso Dantas para o Conselho Nacional de Justiça, ao Conselho da Justiça Federal e à Corregedoria Geral da Justiça Federal da Terceira Região, vai além da solidariedade ao juiz e deverá reavivar o debate sobre as formas de escolha de membros do STF.
FREDERICO VASCONCELOS
ANA FLOR
da Folha de S.Paulo