Vinte e quatro horas depois da rebelião da bancada do PMDB no Senado, que impôs uma derrota ao governo na noite de quarta-feira, ao derrubar a criação da Secretaria de Planejamento de Longo Prazo e de 660 cargos de confiança, o ministro das Relações Institucionais, Walfrido Mares Guia, não escondeu a surpresa. “Foi uma rasteira”, afirmou ele ao Estado. “Não queremos transformar essa situação num conflito insuperável, mas deve ter havido algum sinal, algum descontentamento que nós não percebemos.”
Articulador político do governo, Mares Guia foi chamado logo cedo pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para uma reunião, no Palácio do Planalto. Ainda ontem à noite, Lula foi informado de que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), insuflou a rebelião para mostrar força – irritado com o governo e parlamentares do PT, que agora cobram que ele se licencie do cargo. O presidente tinha, porém, uma preocupação mais imediata: o que fazer para recriar a secretaria extinta, comandada pelo filósofo Mangabeira Unger, além dos cargos comissionados.
Ninguém soube dar a resposta, mas Lula encomendou à sua assessoria estudos jurídicos para resolver o imbróglio criado pelo maior partido da base aliada. Em público, o presidente tentou minimizar a crise, repetindo como mantra que “a derrota faz parte do jogo”. Nos bastidores, porém, afirmou que não conseguia entender a revolta do PMDB. Pior: teme pelo destino que terá a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que ainda precisa passar por mais uma votação na Câmara e duas no Senado.
Coube ao líder do governo no Senado, Romero Jucá (RR), a difícil tarefa de explicar ao presidente os meandros de seu partido, insatisfeito com a distribuição de cargos pelo Planalto. “Vamos ajustar qualquer curto-circuito antes da nova votação da CPMF”, disse Jucá. “Foi uma reação radical e nós entendemos que o governo esperava mais lealdade da base aliada.”
?SURPRESA EXTREMA?
Depois do tête-à-tête com Lula, Mares Guia promoveu uma reunião em seu gabinete com Jucá, a senadora Roseana Sarney (PMDB-MA), líder do governo no Congresso, o presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), e os ministros peemedebistas Geddel Vieira Lima (Integração Nacional) e Hélio Costa (Comunicações). “Recebemos a informação sobre a derrubada da medida provisória que criava a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo com uma surpresa extrema”, afirmou Mares Guia.
O ministro não quis, porém, provocar Renan. Indagado se sabia os motivos pelos quais o senador havia mandado um recado ao Planalto, Mares Guia desconversou. “Eu não posso, não devo e não tenho razão para interpretar o que ocorreu dessa forma”, disse. “Seria o melhor momento para o Senado votar – justamente na hora em que a Câmara deu demonstração de força extraordinária, aprovando em primeiro turno a CPMF.”
Menos diplomático, Geddel deixou o Planalto visivelmente irritado. Não sem motivo: dos 660 cargos de confiança que evaporaram após a rebelião do PMDB, 140 eram da Sudam e da Sudene, superintendências ligadas a seu ministério. “Se os senadores que rejeitaram a MP quiseram dar um recado de que têm uma demanda com o governo, não devem ser atendidos porque agiram de forma infantil”, reagiu. “Ninguém me preveniu e agora quero saber o que fazer com a estrutura da Sudam e da Sudene.”